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CHICO ALENCAR: 2016, isto é, dois mil e… não sei!

“De tédio, nenhum de vocês morreu este ano”, disse o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em entrevista na última semana de dezembro de 2015.

Sua gestão autoritária pode não ter matado ninguém (de tédio), mas sua pauta conservadora e retrógrada, que predominou na Câmara dos Deputados, certamente fez muitas vítimas. Dois mil e crise foi marcado por um contínuo de atropelos e retrocessos. A Proposta de Emenda à Constituição 215 – que transfere para o Legislativo a prerrogativa de demarcação de terras indígenas –, o Estatuto da Família, a revisão do Estatuto do Desarmamento, a aprovação da redução da maioridade penal, das medidas de ajuste fiscal e a minirreforma eleitoral são alguns exemplos.

Além disso, o Legislativo brasileiro nunca esteve sob tanta suspeição. A Operação Lava Jato está desnudando a corrupção sistêmica, com envolvimento de agentes públicos, partidos e empresários. Ainda na presidência da Câmara dos Deputados, Cunha usa seu cargo para benefício próprio, utilizando-se de métodos e aliados para dificultar investigações e atacar, por retaliação, adversários políticos.

Nesse quadro tenebroso, o PSOL atuou fortemente contra medidas que representam um retrocesso para a democracia e a sociedade brasileira. E continuará fiel aos propósitos e necessidades dos cidadãos, por um Parlamento democrático e transparente, e por um país mais justo e igualitário.

Ao longo desse ano, nossa bancada, além da marcante e combativa presença em comissões, no plenário e no acompanhamento a movimentos sociais em todo o país, apresentou 17 Projetos de Lei; 3 Projetos de Decreto Legislativos; 4 Projetos de Resolução; 23 Requerimentos de Informações; 251 Requerimentos de Audiências Públicas e Oitivas; 1 Requerimento de Criação de CPI e 7 Indicações ao Poder Executivo. Em um ano de muitas lutas e em várias frentes, travamos o bom combate.

Sob o signo da incerteza, o ano terminou. Mas a crise continua. Um feixe de crises que segue o seu curso marcado pela expectativa de múltiplos agravamentos. A crise econômica, na opinião de analistas das mais variadas procedências, tende a se agravar.  Suas implicações nas condições de vida do cidadão comum, principalmente da classe trabalhadora, apontam para a eclosão de uma crise estrutural profunda. E, como consequência inevitável, o agravamento da crise política. O Parlamento e o Judiciário, em recesso de virada de ano, deixaram em compasso de espera o processo de impeachment da presidente da República e o pedido de cassação do presidente da Câmara dos Deputados. Sem dúvida, indícios típicos do colapso do sistema político que caracteriza as épocas de fim de ciclo

Entretanto, para quem faz balanço dos acontecimentos políticos em busca de perspectivas, é sempre bom dosar o pessimismo da razão na análise realista de uma situação, sem dúvida adversa e difícil, com o otimismo da vontade dos que apostam na mudança e vislumbram os sinais do novo, que sempre vem. Sem dourar a pílula, realista esperançoso. Afinal, também é verdade que o ano não foi apenas das crises, das trapaças do Cunha, da rapinagem da oligarquia política e empresarial. Apesar das incertezas sobre os desdobramentos da enorme encalacrada, houve muita luta e resistência animadora, embora localizada.  Os estudantes em São Paulo deram lições de política aos mais velhos. As mulheres ocuparam as ruas com a alegria e o vigor dos movimentos que vieram para ficar. Manifestações pontuais, como a luta do passe livre, embora reprimidas, mostraram persistência e continuidade. Os sem-terra, os sem teto, os povos indígenas, quilombolas, ativistas dos direitos humanos, profissionais da saúde e da educação, operários fabris, entre tantos outros, se mobilizaram no contraponto às investidas reacionárias.

Para além do sopro renovador que possa vir das ruas, os desdobramentos da Operação Lava Jato devem interferir fortemente na evolução imediata do quadro político. Ao investigar relações inescrupulosas entre corruptores e corruptos de grande poder econômico e político, ela já ocupa um lugar de destaque na história do país. Nunca houve ação judicial desse porte, atingindo de forma inédita figurões como empreiteiros, lobistas e altas autoridades públicas.

O espectro da Lava Jato prega peças no teatro de sombras do domínio oligárquico. Ela deixa claro que os setores dominantes montaram esquema nefasto de captura do poder político pelos grandes interesses econômicos, com retroalimentação eleitoral e patrimonial. Isto degenera a representação democrática e macula a credibilidade da atividade política. A Lava Jato precisa prosseguir e se aprofundar, sem proteger ou perseguir quem quer que seja, de que corporação empresarial ou partido for.

O justo clamor para que todos os direitos e garantias individuais sejam assegurados deve se estender a qualquer caso, incluindo os sempre vilipendiados suspeitos ou réus sem recursos, que lotam as cadeias e, esses sim, muitas vezes continuam a sofrer torturas físicas e morais. O zelo pelo Estado de Direito não deve inibir uma investigação que tanto incomoda as classes dominantes. A crítica ao real vazamento seletivo de informações não pode se estender à imprensa, na sua função de apurar notícias e revelar fatos de importância para a vida nacional. A colaboração premiada, com previsão legal, tem cumprido importante papel na elucidação do esquema criminoso e no combate contra a corrupção sistêmica, estrutural, que corrói os alicerces da República.

O ocaso do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é outro dado importante na possível mudança de patamar da crise política. Ele é acusado, com provas robustas do Ministério Público da Suíça, de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, ocultação de bens e corrupção passiva. Muito mais do que por “ter mentido à CPI” – afinal, a mentira é o pão dormido da vida política nacional. A Procuradoria Geral da República pede ao STF que ele seja imediatamente afastado do mandato e, por consequência, da presidência da Câmara. Mais cedo ou mais tarde, ele será afastado. Será o momento do contraponto radical à pauta conservadora e retrógrada patrocinada e catalisada pela presença nefasta de Eduardo Cunha na presidência da Câmara dos Deputados.

Barrar o avanço da política de negócios, colocar um paradeiro na apoteose da pequena política, o “modus operandi” de Cunha, é a maneira de defender no presente o futuro de uma mudança profunda nas práticas políticas.  Articular a luta no parlamento com cada um dos movimentos sociais que resistiram e resistem à investida conservadora é a forma de politizar a política. Política ancorada na soberania do povo e na mobilização cidadã, livre da tutela do poder econômico.

São grandes os desafios colocados diante de nós neste ano de 2016. A grande tarefa é recolocar o debate na bitola larga da grande política, aquela que mobiliza cidadãos em torno de ideias e causas na busca do bem comum. Como cantou Cazuza: “Ideologia, eu quero uma pra viver”. Ideologia é como o cimento de uma obra, o amálgama que dá liga a uma construção. Ninguém deixa de ter ideologia, a começar pelos que, com pouco cuidado com as palavras, dizem que tal ou qual posição é “ideológica”. Todas são, sem exceção! Não existe neutralidade, “ciência”, “técnica”, em termos de posições políticas, visões de mundo. Há a ideologia liberal capitalista, que funda-se no individualismo consumista, e há a socialista, que é um vir a ser, uma utopia de edificação de uma sociedade sem classes – ainda que com funções diferenciadas, aí incluídas as de mando democrático, claro. O sonho generoso de uma sociedade solidária, fraterna, ecologicamente sustentável. Onde todos vivam mais simplesmente, para que simplesmente todos possam viver.

 

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