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Nota: organizar uma oposição combativa e democrática para enfrentar o governo Bolsonaro

O ano de 2019 coloca o Brasil, pela primeira vez, sob um governo de extrema-direita. Os primeiros trinta dias de Bolsonaro na Presidência da República tiveram como marca ataques contra o povo, desarticulações e crises entre distintos setores do governo mostrando o quão despreparadas as forças políticas e sociais que venceram as eleições do ano passado estavam para assumir o comando do Estado brasileiro. Foram inúmeras decisões que, em seguida, foram desmentidas ou refutadas. Algumas delas dadas pelo próprio Presidente e reparadas ou negadas por auxiliares de escalões muito inferiores (como no caso do anúncio do aumento da alíquota de Imposto de Renda e queda da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras). A coleção de recuos envolveu, ainda, as mudanças anunciadas na política de livros didáticos, o fechamento da Emissora Brasil de Comunicação (EBC) e a suspensão da reforma agrária. Tudo indica, no entanto, que o governo, o parlamento, os principais grupos econômicos e a grande mídia estão unificados no que pretende ser o primeiro grande ataque do governo Bolsonaro: a Reforma da Previdência.

A composição do governo, seus ministros e as medidas anunciadas em documento divulgado na última semana com as ações prioritárias para os primeiros cem dias, mostram uma completa subordinação aos interesses diretos de Washington e das frações financeiras que comandam o novo ministério da economia. Um exemplo é a concordância do governo com a venda da Embraer para a Boeing, verdadeira entrega de um setor de ponta da indústria nacional, acentuando a dinâmica primário-exportadora e dependente da economia nacional.

O reflexo imediato da vinculação da política externa brasileira aos interesses norte-americanos é a ampliação da instabilidade na América do Sul com o aumento da pressão em favor de saídas militares para a crise na Venezuela em nome dos interesses imperialistas, como demonstram as recentes intervenções do Grupo de Lima. A posição adotada pelo governo brasileiro em reconhecer um líder da oposição como “presidente encarregado” é um aviltante ataque à soberania do povo venezuelano e constitui uma ruptura com a tradição diplomática brasileira, apoiando uma evidente tentativa de golpe de estado. Por isso o PSOL repudia qualquer tentativa de golpe ou intervenção militar estrangeira na Venezuela.

Cabe destacar o protagonismo de militares, em especial do Exército, dentro da equipe ministerial do novo governo, em uma participação inédita deste setor desde a redemocratização do Brasil. A participação das forças armadas nos principais acontecimentos políticos nacionais nos últimos anos atesta um sério risco às liberdades democráticas. O regime político erigido pela Constituição Federal de 1988 vive hoje uma regressão autoritária cuja expressão evidente é a participação das forças armadas e do judiciário, instituições e poderes não eleitos, na vida política nacional. Por isso o PSOL estará engajado na construção de uma ampla unidade em defesa das liberdades democráticas conquistadas pelo povo brasileiro. Uma das iniciativas será a construção do Observatório da Democracia junto com várias fundações partidárias, cujo objetivo será fiscalizar o governo Bolsonaro e denunciar ataques às liberdades democráticas.

Um outro importante núcleo de poder do governo Bolsonaro se encontra no Ministério da Justiça com a figura de Sérgio Moro que representa a participação da operação lava jato e de uma fração do judiciário no governo. Sérgio Moro está encarregado de aprofundar a limites desconhecidos o Estado Penal, a política de encarceramento da juventude negra e a criminalização da pobreza. Moro lidera o processo de “gestão” dos inimigos internos e não por acaso acumula funções antes sob a competência do extinto Ministério do Trabalho. Isso diz muito sobre quem pesará a mão do Estado.

Será o prolongamento da Operação Lava-Jato, ou seja, se buscará estabelecer um processo de repressão institucional sistemática às esquerdas e movimentos populares, com o verniz de combate à corrupção e ao crime organizado, evidentemente sem a agilidade costumeira contra o atual bloco de poder como está notório no caso envolvendo Flávio Bolsonaro ou a solução do assassinato de Marielle Franco.

Na dimensão econômica, o governo é a expressão radicalizada do neoliberalismo, e por isso terá de arcar com o ônus da impopularidade de suas medidas. Sua agenda inclui as privatizações do patrimônio público e recursos naturais, a manutenção da transferência de parcelas crescentes do orçamento público para o setor financeiro, o fim da previdência social, dentre outras. Não há nenhuma originalidade nas propostas de Paulo Guedes, mas uma bricolagem do que há de mais selvagem em termos de desregulamentação e entrega da economia nacional. Como tática de aprovação de tal agenda, tudo indica que o governo utilizará de propostas legislativas reacionárias, mas com apelo de massas (como fez com a flexibilização do acesso às armas de fogo) no sentido de equilibrar com medidas antipopulares na dimensão econômica e de direitos, como a Reforma da Previdência. Assim procura evitar que críticas às suas medidas tomem corpo e assumam uma base social massiva.

O núcleo de extrema-direita do governo está ligado a família Bolsonaro, nas figuras de ministros como Ernesto Araújo, Damares, Ricardo Salles e Ricardo Velez Rodrigues e nos parlamentares do PSL. O foco do núcleo de extrema-direita do governo é se alimentar do combate à esquerda, às mulheres, LGBTs, negros e negras, indígenas e trabalhadores organizados, como os professores e professoras. Esse tem sido, neste primeiro momento, um dos núcleos mais instáveis do governo. O PSOL, fazendo jus ao seu programa, estará na linha de frente da defesa das mulheres, negros, LGBTs, dos indígenas, dos educadores e das riquezas naturais nacionais.

A primeira crise séria do governo envolve a denúncia da enorme quantidade de depósitos não explicados na conta bancária do senador e filho do Presidente, Flávio Bolsonaro. Inicialmente, foram denunciados 48 depósitos suspeitos em 1 mês, no total de R$ 96 mil, realizados entre junho e julho de 2017. Toda movimentação foi analisada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Dias depois a imprensa revelou que, em relatório sobre movimentações atípicas de Flávio Bolsonaro, havia também o pagamento no valor de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa. A alegação de Flávio Bolsonaro foi que havia vendido um imóvel e que depositou o dinheiro na própria conta, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), em 48 envelopes de R$ 2 mil.

Dois dias depois, a imprensa revelou que o ex-assessor de Flávio Bolsonaro se abrigou em uma casa na favela de Rio das Pedras, após ter sido revelado que havia movimentado de forma atípica R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017. Ocorre que esta favela é dominada por milícias, órgãos paramilitares que controlam alguns territórios do Rio de Janeiro. Na mesma semana, cinco suspeitos de envolvimento com o chamado “Escritório do Crime”, suspeito de envolvimento no assassinato de Marielle Franco, foram presos, entre elas um major da Polícia Militar.

Os denunciados são apontados como integrantes da milícia que controla as comunidades da Muzema, Rio das Pedras e adjacências. Justamente a região onde o assessor do filho de Jair Bolsonaro – Fabrício Queiroz – teria se escondido. Rapidamente, a relação entre os fatos gerou uma forte suspeita, muito repercutida nas redes sociais, sobre o envolvimento da família Bolsonaro com milícias paramilitares. Afinal, a mãe e a mulher de um dos denunciados na operação contra milicianos deflagrada no dia 22 trabalharam no gabinete do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Na sequência vieram à tona os discursos e homenagens prestadas pela família Bolsonaro aos milicianos presos. Com isso, passam a existir sérias suspeitas sobre a relação de Flávio, Carlos e Jair – o núcleo carioca do clã – com assassinos e em que medida as transações imobiliárias de Flávio e as operações envolvendo servidores do seu gabinete e do pai estavam a serviço das milícias.

Antes deste episódio, que ameaça parte das bases de legitimação do governo Bolsonaro, nos primeiros dias de sua gestão parecia que os acordos firmados com as lideranças e a bancada ruralista dariam o tom das iniciativas governamentais. Foram muitas ações para desbloquear o avanço do agronegócio sobre reservas indígenas, mesmo ferindo a legislação ambiental. Os ministros Paulo Guedes (Economia) e Moro (Justiça) trabalharam na montagem de equipes e planejamento inicial dessas ações.

O governo combina, portanto, dificuldades de três dimensões. A primeira, a incapacidade técnica da maioria dos quadros indicados aos ministérios e a completa desorientação de rumos na comunicação institucional. Isso deve dificultar medidas de impacto no primeiro semestre. A segunda, uma base de apoio parlamentar ainda muito inconsistente, como prova a necessidade de apoio, por parte do PSL – único partido efetivamente sob controle do Planalto – à candidatura de Rodrigo Maia. E a terceira, a crise política gerada pelas suspeitas de envolvimento de Flávio Bolsonaro e do próprio presidente da República com milicianos e assassinos.

Diante dessa situação, o PSOL tem trabalhado seguindo as diretrizes aprovadas pela última reunião do seu Diretório Nacional. Primeiro, buscando a unidade do campo democrático e progressista em torno de uma ampla frente contra o governo Bolsonaro. Esse esforço se materializou, particularmente, no esforço de construção da unidade na disputa para a presidência da Câmara dos Deputados. Apresentamos o nome do companheiro Marcelo Freixo para essa disputa, abrindo um debate público sobre o perfil de oposição que o Brasil precisa nesse momento. As negociações estão em curso, mas estamos cientes da importância que esse movimento teve até aqui e do papel cumprido pelo deputado Marcelo Freixo.

Além da luta por uma Câmara dos Deputados independente, trabalharemos em mais três frentes:

A primeira frente, no enfrentamento aos ataques do governo Bolsonaro aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, juventude, mulheres, negros e negras, LGBTs e indígenas. A batalha inaugural será, sem dúvida, a reforma da previdência. Foi a luta nas ruas que derrotou a reforma de Temer. Só a luta nas ruas pode barrar a reforma de Bolsonaro porque o povo brasileiro não aceita o fim da aposentadoria, da previdência pública e a retirada de direitos previdenciários já assinada por Jair Bolsonaro no Decreto de revisão dos benefícios. O PSOL participará da ampla unidade contra a reforma da previdência expressa na unidade entre partidos, centrais sindicais, sindicatos e movimentos sociais.

Além disso, denunciaremos a tentativa do novo governo de flexibilizar ainda mais as leis ambientais, como que ignorando a tragédia acontecida em Brumadinho, quando uma barragem da Vale se rompeu, provocando dezenas de vítimas fatais. Flexibilização que tem como outro lado da moeda a perseguição e o fim da demarcação das terras indígenas para fins de facilitar o avanço do agronegócio e de um modelo agrário-exportador destruidor da natureza.

Como parte da luta social e democrática ganhará peso e será uma campanha central nossa a luta das mulheres, contra o feminicídio e por justiça para Marielle Franco. A construção do 8 de março será uma das campanhas centrais do PSOL e sem dúvida será parte da grande resistência que tem no protagonismo da luta das mulheres um ator central.

A segunda frente é a luta em defesa das liberdades democráticas e contra a criminalização dos movimentos sociais.

A decisão de nosso deputado Jean Wyllys de não assumir seu mandato de deputado federal na legislatura que se inicia no próximo dia 1º mostra o nível de degradação do ambiente democrático no Brasil. Ameaçado, perseguido e vilipendiado com mentiras disseminadas pelas redes bolsonaristas, Jean Wyllys é mais uma vítima do crescente cerco à democracia e às liberdades democráticas. Faremos deste episódio – agravado pela tentativa criminosa de associar Jean ao atentado cometido contra Bolsonaro em setembro último – uma oportunidade para denunciar em alto e bom som os ataques do novo governo e seus agentes contra a democracia. A luta contra as ameaças à democracia significa em termos práticos nossa solidariedade a Jean Wyllys, nossa exigência de apuração de todas as ameaças de morte, nosso rechaço a atitude anti-democrática do presidente em relação a Jean.

No dia 14 de março, data que completa 1 ano do assassinato de Marielle Franco e Anderson, organizaremos em todo o Brasil manifestações de denúncia da impunidade, exigindo Justiça para Marielle Franco.

Além disso, lutaremos contra qualquer tentativa de criminalização dos movimentos sociais, especialmente o MTST e o MST, alvos da retórica de família Bolsonaro. As propostas de alteração na lei antiterrorismo, buscando ampliar seu alcance às ações de movimentos sociais legítimos é uma aberração que terá toda a oposição do PSOL.

A terceira frente é a exigência de apuração até o fim das denúncias de corrupção contra Flávio Bolsonaro e a apuração da ligação da família Bolsonaro com os milicianos no Rio de Janeiro.

As denúncias contra Flávio Bolsonaro evidenciam a presença de familiares de milicianos condenados por assassinato dentro dos mandatos e nas relações íntimas da família Bolsonaro. A escalada autoritária liderada pela família do presidente e seus seguidores, portanto, não se resume ao ódio destilado nas redes sociais: ela é uma ameaça real.

Organizar uma ampla resistência democrática, social e popular ao governo Bolsonaro, à sua agenda neoliberal e antidemocrática continua no centro da política do PSOL. Por isso seguiremos lutando para construiremos um novo projeto de esquerda no Brasil, aliado com os movimentos sociais que estiveram conosco nas eleições de 2018.

Executiva Nacional do PSOL
31 de janeiro de 2019


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