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Uma vitória popular – Uma nova etapa se abre no Chile

A noite pareceu interminável. Os festejos em Santiago, na praça da Dignidade, ainda que oficialmente chamem de Baquedano, expressaram o que sentiu em toda as cidades do Chile: uma alegria imensa por estar sendo enterrada a constituição herdada da Ditadura e do pinochetismo. O resultado do plebiscito foi consagrador. A maioria aplastante votou pelo “aprovo” e pela “convenção constituinte”. Na maior votação da história recente do Chile, segundo o próprio TSE local, quase seis milhões de chilenos – num universo de 7, 5 milhões de votantes – deram mais de 78% para a opção “aprovo”, que significa uma nova constituição, e 79% para que essa constituição seja redigida por uma convenção, com paridade de gênero, exclusivamente para esse fim. Se abre uma nova etapa na vida política e democrática do Chile.

No Brasil, onde Paulo Guedes e Bolsonaro fazem do Chile seu modelo da experimento de autoritarismo e neoliberalismo, os ecos dessa vitória apenas começam a se fazer sentir. Ao contrário dos discípulos dos “chicago boys” e apologistas da tortura, reafirmamos que o Chile pode ser uma experiência sim para enterrar o neoliberalismo. Bolsonaro e seus aliados amargam mais uma derrota, depois da contundente vitória do povo boliviano contra os golpistas no domingo último.

Após anos de agitação, a hipótese de uma nova constituição só se tornou real após a rebelião de 18 de outubro de 2020, onde se iniciou um processo – com traços revolucionários – de profundas transformações no Chile. O Outubro de 2019 foi a maior mobilização do Chile contemporâneo, chegando ao seu estágio superior, na maior greve geral da história do país, em 12 de novembro de 2019. A esquerda da Frente Ampla e o PC não participou da mesa de negociações que buscou o “cessar-fogo” em 15 de novembro de 2019. Duas heranças dos combates de outubro: se registraram as maiores manifestações da história do Chile, com mais de um 1 milhão de pessoas em Santiago; se colocou para setores de massa o questionamento a ação dos Carabineros, que deixaram com lesões visuais centenas de ativistas, levando a ampla maioria da população chilena a repudiar a violência policial. Na aprovação da constituinte, estavam sendo vingados, de algum jeito ou outro, os centenas que perderam a visão no outubro do ano passado, vitimas da violência de estado, e os que perderam a vida na mais sangrenta ditadura do continente, chefiada pelo genocida Augusto Pinochet Ugarte.

Esse processo não surgiu agora. A crítica aos acordos de transição, em que a centro-esquerda, através do PS, pactuou a manutenção da constituição e de um plano neoliberal, surgiu dos setores mais radicalizados da sociedade, com um enorme caldo de cultura para uma esquerda independente e um movimento social potente.

Surgiram novos embates e atores políticos, que já vinham do ascenso estudantil iniciado em 2011, com muito peso das mulheres em luta, como acúmulo da construção das coordenadoras do 8-M; a bandeira dos mapuches foi o símbolo do levante de outubro, se resgatou a esperança na auto-organização popular.

Vínhamos afirmando que uma nova dinâmica estava se abrindo no continente com as rebeliões do Equador e Chile, ao final de 2019. Com o efeito da pandemia, estes processos ficaram congelados; durante o primeiro semestre cresceu o questionamento a Trump nos Estados Unidos, com o auge da rebelião antiracista e a explosão de lutas da negritude contra a violência policial. Agora os processos voltam a dar saltos: vitória de Arce e do MAS na Bolívia, plebiscito no Chile e quiçá ver a derrota de Trump na eleição dos Estados Unidos.

A nova etapa política no Chile vem acompanhada de esperança e de uma busca por uma esquerda renovada, que seja capaz de fazer a disputa de hegemonia da sociedade, mas possa estar por fora do cupulismo e dos pactos que marcaram o ciclo anterior, onde o dito “progressismo” abriu caminho para a confusão. Enterrar de vez os entulhos da ditadura chilena é um ponto de inflexão.

Esse é um passo, um grande passo. Agora a disputa é por qual projeto de país passa a nova constituição, que tem travas importantes como a aprovação por 2/3 de temas polêmicos. O movimento social deverá fazer a disputa para as bandeiras que são as da maioria social. Por toda a Cordilheira dos Andes, a luta se aprofunda. Seja na vitória popular boliviana, na retomada da rebelião equatoriana, nas mobilizações que crescem na Colômbia, e agora, como ponto alto, o processo estrutural que o Chile responde.

O lugar do PSOL, muito ativo nessas batalhas, é ser solidário e fomentar o debate político internacionalista, nesse momento no continente, resgatando o sentimento latinoamericanista e dando nossa contribuição para derrotar a extrema-direita, de Bolsonaro e Trump, nas ruas e nas urnas. Estaremos apoiando o bravo povo chileno em mais essa fase de debate e de luta por controlar seu próprio destino.

Por Israel Dutra
Secretário de Relações Internacionais do PSOL

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