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Juliano Medeiros: O Brasil na COP do petróleo

Por Juliano Medeiros, ex-presidente nacional do PSOL

Quando os Emirados Árabes Unidos foram escolhidos para sediar a COP28, um grande desconforto tomou conta dos movimentos sociais e organizações da sociedade civil que discutem e enfrentam a crise climática. Afinal, o país não é reconhecido pela liberdade política que garante a seus cidadãos. Num contexto em que a voz dos atingidos pelas mudanças climáticas é cada vez mais secundarizada nas COPs, a decisão de levar a Conferência do Clima da ONU para Dubai era um péssimo sinal.

Mas tudo o que é ruim sempre pode piorar. O governo dos Emirados Árabes, um dos principais atores da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), indicou ninguém menos que o presidente da petroleira do país para presidir a COP. O sujeito que disse em uma entrevista que “não há ciência” na eficácia da eliminação gradual dos combustíveis fósseis para limitar o aquecimento global a 1,5°C, segundo o jornal britânico The Guardian.

Numa COP feita sob medida para fortalecer o lobby do petróleo, onde consultores das grandes companhias petrolíferas tinham mais acesso que pesquisadores e ativistas ambientais, o Brasil tinha uma chance de ouro para brilhar. O fim do governo negacionista de Bolsonaro, a queda expressiva no desmatamento da Amazônia, a retomada da demarcação das terras indígenas e a realização da COP30 em Belém, eram credenciais mais que especiais para o Brasil.

Com um discurso contundente do presidente Lula mencionando os gastos militares em comparação com os esforços frágeis para financiar a transição de modelo, uma presença marcante das ministras Marina Silva e Sônia Guajajara – que chegou a chefiar a delegação brasileira durante alguns dias – e uma grande presença de movimentos e organizações da sociedade civil, todos os olhares estavam voltados para o Brasil.

No balanço final, porém, ficou evidente para o mundo as ambiguidades de um governo de coalizão atravessado por diferentes interesses. Enquanto os ministérios dos povos indígenas e do meio ambiente reforçavam os compromissos do Brasil com uma transição justa e inclusiva, o ministério de minas e energia e a Petrobras sinalizavam com a ampliação da exploração de combustíveis fósseis.

O anúncio do leilão de mais de 600 poços de petróleo, combinada com a entrada do Brasil na OPEP (mesmo como convidado) e a desastrosa declaração do presidente da Petrobras de que o Brasil “será um dos últimos países a deixar de extrair petróleo” renderam ao governo braseiro o anti-troféu Fóssil do Dia, uma menção irônica aos países que vacilam nos esforços de combater o aquecimento global (em 2019 o Brasil também foi agraciado com o anti-prêmio por legitimar a grilagem e o desmatamento). Tudo isso na mesma semana em que o Senado aprovou o “pacote do veneno” e a Câmara ampliou benefícios fiscais para as usinas termoelétricas a carvão.

Mas apesar da ambiguidade de suas posições, o Brasil ainda pode ser parte decisiva da luta contra o aquecimento global e por uma transição justa. A liderança dos povos indígenas brasileiros nesse debate deve servir de exemplo. Mas para isso os discursos e as ações devem ter coerência entre si. O Brasil foi a Dubai para cobrar, mas acabou sendo cobrado. Uma frustração inquestionável quando o país enfrentará o difícil debate acerca da conveniência da exploração de petróleo na Margem Equatorial, incluindo a Foz do Rio Amazonas.

A COP30, em Belém do Pará, governada por um militante ambientalista do PSOL, poderá ser um ponto de virada, alinhando o uso dos recursos estratégicos como o petróleo a uma agenda ambiental agressiva. Mas para isso, será preciso fortalecer as ações dos setores do governo brasileiro comprometidos com a transição de modelo. Esse é o papel de quem quer que o Brasil cumpra sua vocação de potência ambiental.

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